terça-feira, 12 de julho de 2011

Essências que curam

O artigo é da revista Mente e Cérebro, de agosto de 2006, escrita por Jörg Zittlau, que é é doutor em filosofia, professor da Universidade Técnica de Administração Pública, em Wuppertal, Alemanha, e jornalista científico.
A aromaterapia tem interessado diversos cientistas. Já não há dúvida de que alguns óleos essenciais agem no corpo e nas emoções. Resta saber até que ponto podem ser usados para curar doenças.
O boom da aromaterapia teve início nos anos 90 e foi resultado, ao menos em parte, da descoberta dos efeitos antibióticos do óleo da melaleuca, planta australiana também conhecida como árvore do chá. Hoje muitos terapeutas usam os óleos essenciais para tratar casos de stress e problemas emocionais. Médicos e farmacêuticos empregam os aromas para relaxar seus pacientes. Alguns psiquiatras reconhecem o efeitos dessas essências no tratamento de ansiedade, dores crônicas e distúrbios de sono. Já estava mais que na hora de submeter a aromaterapia ao escrutínio científico.
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O uso dos óleos essenciais para fins terapêuticos tem longa tradição. Há mais de 3 mil anos a medicina aiurvédica indiana emprega o extrato de alecrim para tratar estados de angústia, e o de cravo e o de coentro para dificuldade de concentração. Na Europa, os óleos aromáticos tornaram-se populares nas epidemias da Idade Média. Para se proteger da contaminação, os médicos que tratavam os doentes da peste bubônica usavam máscaras pontudas, dentro das quais era colocada uma esponja embebida em óleos essenciais.
Para a terapeuta alemã Nicole Unger, os aromas são também medicamentos. O óleo essencial de cravo, por exemplo, é usado por ela para iniciar contrações em mulheres no final da gravidez. As dores do parto são amenizadas com o óleo de lavanda. “A aromaterapia elimina tensões e bloqueios psíquicos e é excelente para reconstituir a harmonia corporal”, afirma.
O termo aromaterapia foi cunhado em 1928 pelo químico francês René Maurice Gattefossé. Desde então a eficácia dos óleos essenciais vem sendo testada, embora os resultados acumulados até hoje não forneçam um quadro suficientemente claro. Apesar disso, há um ponto sobre o qual a maioria dos especialistas está de acordo: as essências aromáticas realmente atuam sobre o corpo e as emoções. As moléculas odoríferas são transportadas através da mucosa nasal e dos brônquios até a circulação sangüínea e desta para os órgãos.
  Por serem pouco hidrossolúveis, ultrapassam facilmente a barreira hematoencefálica e atingem o sistema nervoso central. Além disso, essas essências são naturalmente agradáveis ao olfato – que é considerado o sentido mais antigo do ponto de vista evolutivo e que tem conexões particulares com centros sensoriais do cérebro. “O sistema olfativo é o único que possui um acesso direto ao sistema límbico”, explica o fisiologista Hanns Hatt, da Universidade de Ruhr, Alemanha. “É a parte do nosso cérebro onde se originam várias sensações, como fome e sede. Nele também têm início determinadas reações emocionais e sexuais, e isso funciona até mesmo durante o sono.”
Hatt testou os efeitos de mais de cem odores sobre batimentos cardíacos, freqüência respiratória e sonhos. Em um dos experimentos, borrifou os participantes adormecidos com odores fecais. Mesmo dormindo, eles prenderam a respiração e a freqüência cardíaca diminuiu. No dia seguinte, a maioria dos participantes relatou pesadelos. Outro grupo, no qual foi borrifado aroma de laranja, dormiu tranqüilamente.
Os aromaterapeutas gostam de citar resultados como esses e não se cansam de enaltecer as propriedades relaxantes ou tonificantes da aromaterapia. Gerhard Buchbauer, da Universidade de Viena, observou efeitos semelhantes no início da década de 90. Os experimentos foram feitos com ratos cuja locomoção era monitorada por meio de barreiras luminosas na gaiola. Alguns animais foram estimulados com cafeína; a outros foi administrada uma potente droga tranqüilizante, o diazepam. Em seguida, o pesquisador tentou acalmar os animais excitados pela cafeína com óleo de lavanda, de sândalo e de néroli, enquanto tentava reanimar o outro grupo com essência de jasmim, de hortelã-pimenta e de capim-limão. Os efeitos esperados foram observados em ambos os grupos. Além disso, Buchbauer comprovou a presença das substâncias odoríferas no sangue dos roedores. Tudo indicava que a alteração do comportamento dos animais estava diretamente relacionada à inalação das essências aromáticas.
Os efeitos inequívocos do óleo de alecrim e do de lavanda sobre o corpo humano foram comprovados em 1998 por psicólogos da Universidade de Miami. Por meio do registro eletroencefalográfico (EEG) de 40 pessoas, eles mostraram que a lavanda diminui a freqüência das ondas cerebrais, provocando sonolência, ao passo que o traçado do EEG dos que haviam inalado alecriam indicava estado de alerta. Estes levaram menos tempo para resolver um teste de matemática do que pessoas que não haviam recebido nenhum tratamento aromático. No entanto, o número de erros cometidos foi parecido nos dois grupos. Ainda é incerto o verdadeiro efeito do óleo de alecrim sobre a concentração.
Um dos principais problemas dos experimentos com aromaterapia está no fato de as expectativas dos participantes influenciarem as reações corporais. E não é possível realizar estudos duplo-cego – nos quais voluntários e pesquisadores desconhecem qual o tratamento ministrado -, já que a identificação do odor é inevitável. Uma forma de contornar a situação seria recrutar pessoas completamente anósmicas, isto é, incapazes de detectar qualquer odor. Infelizmente, não é fácil encontrá-las. Elas são menos de 5% da população. Alguns aromaterapeutas argumentam que a própria sensação olfativa constitui um dos mecanismos pelos quais os óleos essenciais agem. Ao subtrair o aspecto sensorial, portanto, o poder terapêutico poderia ser eliminado.
Então não é possível avaliar a aromaterapia com os mesmos critérios usados para os medicamentos? A pergunta motivou o médico Edzard Ernst, da Universidade de Exeter, Reino Unido, a vasculhar os bancos de dados sobre o assunto. Encontrou pelo menos seis estudos clínicos, realizados entre 1993 e 2000, que atestavam categoricamente os efeitos relaxantes da aromaterapia. Segundo eles, massagens com óleos de lavanda, de laranja e de camomila podem reduzir a sensação de stress, ainda que por pouco tempo na maioria dos casos. Parece que o efeito dos óleos essenciais se dissipa rapidamente. “Tenho dúvidas de que a aromaterapia possa concorrer de igual para igual com outras terapias que eliminam medos ou tensões”, diz Ernst.
Evidências e Esoterismo
Sandra Sgoutas-Emch, psicóloga da Universidade de San Diego, chegou a conclusões semelhantes em um experimento com 60 voluntários divididos em quatro grupos, dos quais dois não receberam nenhum tipo de tratamento aromaterápico, embora um deles tenha sido levado a crer que sim.
Em salas isoladas, cada participante deveria resolver tarefas de cálculo sob a pressão de um tempo máximo determinado. Durante o teste e depois dele, os pesquisadores mediram a pressão arterial e a freqüência cardíaca de cada um. Os voluntários também responderam um questionário sob o stress a que haviam sido submetidos. Os quatro grupos se saíram igualmente bem no teste de matemática. A pressão arterial e os batimentos cardíacos também se elevaram de forma homogênea entre os grupos. Todos concordaram que o teste não os havia deixado muito nervosos. “Talvez a tarefa tenha sido fácil demais, talvez não tenha sido um estímulo estressante”, admite a psicóloga.
 http://www.mulherescomdilma.com.br/wp-content/uploads/2010/03/oleo-essencial.jpgEm 1996, neurologistas alemães descobriram que a massagem com óleos aromáticos e não a inalação pode surtir efeitos significativos. Liderados pelo especialista em enxaqueca Hartmut Göbel, da Clínica de Dor de Kiel, Alemanha, eles observaram que a fricção de óleo de hortelã-pimenta na testa e nas têmporas de portadores de cefaléia tensional surtiu efeito tão eficaz quanto a ingestão de 1 grama do analgésico paracetamol.

Os médicos imaginam que ao resfriar a pele de forma agradável, o óleo de hortelã-pimenta bloqueie os receptores de serotonina e de substância P, neurotransmissores que comunicam o estímulo doloroso para o cérebro. Em 2005, cientistas japoneses chegaram a resultados parecidos. Eles avaliaram a ação de massagens aromáticas em mulheres no climatério e observaram alívio da dor e melhora da disposição geral. No mesmo ano, pesquisadores coreanos publicaram um artigo sobre a fricção regular de óleo de lavanda nas mãos de pacientes com doença de Alzheimer. Houve diminuição dos estados ansiosos e agressivos, porém sem progressos em relação à memória e à capacidade de aprendizagem.
Há claros indícios de que certas essências aromáticas não apenas melhoram o estado emocional, mas também combatem dores. No entanto, eles não são suficientes para comprovar a eficácia da aromaterapia em geral, já que nela são utilizadas dezenas de essências diferentes, a maioria ainda não testada por métodos científicos. Infelizmente, a situação pode resvalar no esoterismo quando alguns terapeutas consideram os óleos aromáticos como a “alma da planta” ou atribuem a eles “propriedades altamente energéticas”.
O mais problemático, porém, é alguns aromaterapeutas assumirem casos típicos de distúrbios de ansiedade e depressão e impedirem o tratamento psicoterápico ou psiquiátrico. Qualquer pessoa pode se autodenominar aromaterapeuta, e não há exigência de certificado específico de qualificação. Assim, nessa área é possível encontrar desde profissionais com formação sólida, como médicos, farmacêuticos ou psicólogos, pessoas com boas intenções mas sem formação específica, até todo tipo de aproveitador.
Contudo, uma coisa é certa: exceto no caso de alergias, os óleos essenciais não causam efeitos  adversos, pelo menos não mais que outros produtos vegetais. O óleo de melaleuca, freqüentemente difamado como “poderoso alergênico”, já se mostrou capaz de reduzir inflamações cutâneas mediadas por histamina, que são típicas das reações alérgicas. O risco de intoxicação por óleos aromáticos existe apenas se eles forem ingeridos a colheradas. Isso, porém, não deveria ocorrer facilmente com pessoas de olfato e paladar em ordem.
~ tradução de Sonali Bertuol
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Breve história dos aromas

As plantas aromáticas têm sido usadas para promover o bem-estar por quase todas as culturas. Parecem ter sido os chineses os primeiros a empregar incensos aromáticos à base de plantas para finalidades espirituais e medicinais. Os egípcios também os utilizavam para embalsamar seus mortos.
 Os gregos aprenderam muito com os egípcios, embora creditassem as propriedades medicinais dos aromas aos poderes divinos. Hipócrates tinha o hábito de defumar os doentes. Com o conhecimento herdado de egípcios e gregos, os romanos expandiram fronteiras. No livro De materia medica, Dioscórides descreveu cerca de 500 plantas, muitas delas aromáticas, bem como um método detalhado de destilação que, no entanto, não era capaz de extrair os óleos essenciais.
Um evento decisivo para a difusão da aromaterapia (ainda que o termo fosse surgir só na década de 30) ocorreu no século XI com a invenção de um tubo de resfriamento espiralado pelo filósofo persa Avicena. A nova técnica deu eficiência à destilação dos óleos essenciais e aumentou o número de interessados. Com o surgimento da indústria perfumista no século XIII, cresceu sua comercialização para fins medicinais e cosméticos.
Durante a Peste Negra, espalharam-se rumores de que o contato com essas substâncias estaria poupando os perfumistas da epidemia, por isso elas foram amplamente adotadas, sobretudo por médicos e enfermeiros. Os aromas popularizaram-se ainda mais nos séculos seguintes, até que o advento da química sintética na virada do século XX e a nova geração de medicamentos a que ela deu origem esmaeceram temporariamente o interesse por produtos naturais.
A aromaterapia ressurgiu na década de 30 pelas mãos do químico francês René-Maurice Gattefossé. Depois de queimar gravemente o braço em seu laboratório, ele teve o reflexo de mergulhá-lo em um tonel de óleo de lavanda. Os efeitos sobre o ferimento levaram-no a estudar os aromas em geral. Seu livro Gattefossé’s aromatherapy, de 1937, é um clássico sobre o assunto.


Fonte: zephyrus por Luciana Christante ((•)) Ouça essa Postagem

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